Karina Cedeño   |   14/10/2022 09:58
Atualizada em 14/10/2022 17:54

Obras no aeroporto de Noronha já impactam turismo local

Companhias aéreas, resorts, restaurantes e guias de turismo sentem o impacto das recentes mudanças


Governo de Pernambuco
O arquipélago que tem o Turismo como sua principal fonte de renda tem sido afetado com os recentes acontecimentos relacionados às obras no aeroporto
O arquipélago que tem o Turismo como sua principal fonte de renda tem sido afetado com os recentes acontecimentos relacionados às obras no aeroporto
Após o anúncio das obras no aeroporto de Fernando de Noronha, que tiveram como consequência a suspensão de pousos de jatos e o cancelamento/remanejamento de voos para o destino, o turismo local já começa a sentir os impactos da situação.

Companhias aéreas, resorts, pousadas, restaurantes, guias de turismo e passageiros foram pegos de surpresa e tiveram de “se virar nos 30” para remanejar suas reservas, remarcar voos e arrumar alternativas para lidar com o problema.

A Azul, que possui modelos de aeronaves que podem pousar no aeroporto, mantém suas operações para o destino por meio de seus ATR 72-600, em voos que ligam Recife ao arquipélago. A companhia, que inicialmente havia anunciado o cancelamento da venda de passagens aéreas até janeiro de 2023, retomou as vendas ontem (13)

A Gol, que conta com dois voos diários entre Recife e a ilha, também sofreu impacto em suas operações e anunciou em comunicado que, “com prioridade máxima, está entrando em contato com seus clientes e moradores da ilha com passagens emitidas com destino ou partida de Fernando de Noronha para as tratativas de acomodação, crédito ou cancelamento, e coloca à disposição sua central de atendimento pelo 0300-115 2121.”

RECEPTIVOS E hotÉIS têm alta de CANCELAMENTOS
Mesmo com todas as tentativas feitas pelas companhias aéreas para resolver o problema da melhor forma possível, o turismo de Fernando de Noronha foi afetado como um todo e ainda busca meios de lidar com o ocorrido.

“A começar pela queda no número de turistas, que ocorre não só por causa dos voos cancelados, como também devido ao modelo de avião que está sendo utilizado desde que o aeroporto anunciou a suspensão de pousos de jatos. Antes eram turbojatos com 120 lugares e uma média de cinco voos diários, ou seja, chegavam à ilha aproximadamente 600 passageiros por dia. Agora, estão sendo usados ATRs com capacidade para 70 pessoas. Considerando os mesmos cinco voos diários, a capacidade cai para 350 passageiros por dia, praticamente a metade do número de turistas que chegavam antes”, comenta o sócio gestor da empresa de receptivo Atalaia Noronha, Hayrton Menezes de Almeida, que também é presidente do Conselho de Turismo de Noronha (Contur).

“Estamos tendo muitos pedidos de cancelamento de reservas, tanto nos hotéis quanto nos passeios. Os clientes estão inseguros com o fato de não conseguirem embarcar”, comenta Menezes.

O sócio proprietário da pousada Flat Vista Mar, Carlos Eduardo Damiati Alves, conta que, desde que foi noticiada a suspensão de jatos no aeroporto de Noronha, as reservas na pousada começaram, nas palavras dele, a cair que nem dominó.

“Quando a notícia saiu, na sexta-feira passada, já começamos a receber mensagens dos hóspedes. Tínhamos bastante movimento para outubro e novembro, como é tradicional, pois são meses bem procurados por questões do clima em Fernando de Noronha, sem chuvas e mar tranquilo para mergulho, snorkel e banho de mar, e a pousada estava com ocupação máxima. De repente, as reservas começaram a cair, principalmente por parte de passageiros da Gol, que ainda não têm a opção de fazer a remarcação dos voos”, comenta Alves, cuja pousada já teve, até agora, 20 reservas canceladas.

“Isso gera prejuízos enormes para a gente, porque nossa política de reservas diz que cancelamentos com menos de 30 dias não dão direto a reembolso, mas alguns clientes querem o reembolso de qualquer forma, pois não têm culpa pela situação. Nós tentamos explicar que também estamos sendo muito prejudicados com isso e, ainda assim, acabamos tendo que reembolsá-los, mesmo estando fora da regra, sob ameaça de nos acionarem judicialmente. Outros clientes, por sua vez, aceitam a opção de guardar créditos, assim como fizemos na época da pandemia”, conta o sócio proprietário da pousada Flat Vista Mar.

Mas o prejuízo financeiro é apenas um dos problemas. “Ainda estávamos nos recuperando dos impactos da pandemia quando explodiu essa outra bomba (a questão das obras no aeroporto). Tentamos manter a cabeça fria, mas está difícil”, conclui Alves, ressaltando sua decepção com a omissão dos poderes públicos e a forma como a ilha é administrada.

O Nannai Noronha Solar dos Ventos também estava com boa procura de hóspedes quando as obras no aeroporto foram anunciadas. O resort estava lotado e, até o final de novembro, não tinha mais datas disponíveis para reserva.

“Fomos pegos de surpresa. Houve falta de planejamento ou de execução nessa questão do aeroporto. Em um primeiro momento, a situação foi mais difícil, pois os hóspedes ficaram preocupados ao terem de remanejar sua viagem, revendo a possibilidade de fazê-la mais para frente. Demos a eles a possibilidade de se hospedar no Nannai Muro Alto ou de serem reembolsados, mas eles ficam apreensivos de qualquer forma, afinal, ninguém se planeja para ir a Noronha do dia para a noite e, tendo esse estresse causado antes da viagem, a situação fica tensa”, afirma o gerente comercial do Nannai Solar dos Ventos, Rodrigo Lins. Ele conta que a maior parte de seus clientes com reserva feita iria viajar pela Azul, o que causou menos impacto na hora de resolver o problema.

Além dos hóspedes, a questão afeta também os colaboradores do Nannai que precisam se deslocar por via aérea e o transporte de insumos que saem e chegam ao resort. Lins também conta que o Nannai Solar dos Ventos já estava pronto para dar início às vendas do Réveillon, mas que com a atual situação, o jeito é esperar que as obras no aeroporto sejam finalizadas o mais rápido possível para que as operações de jatos voltem a ser liberadas.

Porém, ao que tudo indica, essa solução não será imediata. “As obras emergenciais têm prazo de 60 dias para serem concluídas. Depois, a Anac será convidada a fazer nova inspeção para ver se libera o aeroporto ou não. Ou seja, já temos certo que pelo menos para os próximos 60 dias não teremos aeroporto liberado para turbojatos e isso impactará nas vendas futuras, considerando que as companhias aéreas não abrem venda sem ter certeza do que vai acontecer”, comenta o sócio gestor da empresa de receptivo Atalaia Noronha.

Como se vê, o impacto na hotelaria de Noronha é generalizado. A presidente da Associação de Pousadas de Fernando de Noronha (APFN), Lúcia Roberta Smith Costa, comenta que, sendo Fernando de Noronha um destino peculiar e no qual 100% da população depende do fluxo turístico, essa situação impacta diretamente a economia da ilha, tão pouco tempo atrás fechada por quase sete meses pela pandemia de covid-19.

“Mais uma vez o setor hoteleiro da ilha, mesmo estando totalmente alheio ao problema apresentado, se vê obrigado a tentar uma solução que fique viável para as pousadas e que seja respeitosa para com seus hóspedes”, comenta Lúcia.

“Seguindo a determinação da Associação das Pousadas de Fernando de Noronha (APFN), estamos deixando crédito para remarcação sem custo das reservas para hóspedes que adquiriram passagens da Gol, não conseguiram disponibilidade na Azul para voar nesse período e tiveram as mesmas canceladas. O crédito terá 12 meses de validade. Lamentamos o ocorrido e nos solidarizamos com todos esses passageiros”, conclui a presidente da APFN.

RESTAURANTES TAMBÉM SENTEM IMPACTO
Além das companhias aéreas, dos passageiros e hotéis, os restaurantes de Fernando de Noronha também foram impactados pelas obras no aeroporto e a falta de voos. O sócio proprietário do Varanda Restaurante, Fernando Buarque, conta que o número de clientes caiu, mas que a situação deve ser amenizada com a continuidade das operações da Azul para a ilha.

“Eu concordo com a execução da obra na pista do aeroporto, mas não com a maneira como foi feita, já que nós, empresários, companhias aéreas, moradores e demais pessoas, não fomos avisados sobre ela. Fomos pegos de surpresa, o que resultou em todo esse caos que está sendo noticiado”, comenta Buarque. “Estamos lidando com isso com paciência, trocando o envio de cargas que antes vinham de avião para virem de barco, para que não faltem mercadorias e produtos essenciais para o funcionamento do restaurante”, desabafa Buarque.

guias de turismo revelam indignação
A redução do número de visitantes em um arquipélago que tem o Turismo como principal fonte de renda é um fator que gera indignação para a guia de turismo Camila de Lima Barreto.

"O impacto com certeza é negativo e muitos turistas já entraram em contato comigo e com os meus colegas informando cancelamentos e alterações de voos. Pelas novas notícias acredito que medidas sejam tomadas, mas nesse meio tempo, provavelmente, teremos uma queda nos passeios e atividades, logo no período de alta temporada. Entendo que é pela segurança e apoio. Mas não deixo de ficar indignada com o fato de a situação ter chegado a esse ponto. É muito descaso com a ilha e com o Turismo, que é a principal fonte de renda do arquipélago", comenta Camila, que tem ajudado os turistas na questão dos reembolsos com as empresas.

"A culpa não é nossa, muito menos deles, que ainda perdem o sonho da viagem para cá. Estava mais preocupada no início, pela queda no movimento e na própria segurança dos voos. Mas estou confiante que as obras no aeroporto são algo importantíssimo e que precisa ser resolvido o quanto antes pelos órgãos competentes".

O guia de turismo Paulo Sérgio da Silva Santos ressalta que a situação no aeroporto poderia ter sido evitada. "De dois anos para cá, diversas questões burocráticas e administrativas relacionadas ao aeroporto vinham se arrastando sem serem concluídas. Então, a Anac fez a vistoria, viu que as condições da pista não estavam aceitáveis e tomou essa medida drástica", comenta Santos.

"O aeroporto é a principal via de entrada em Fernando de Noronha. Sem esse acesso, a economia da ilha não gira", conclui.

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