Filip Calixto   |   21/11/2022 11:50
Atualizada em 21/11/2022 17:41

Quantos profissionais negros de sucesso você conhece?

Em artigo, Rogéria Pinheiro reflete sobre a representatividade negra em posições de liderança no Turismo


Reprodução/ Youtube Rogéria Pinheiro
Rogéria Pinheiro é fundadora e mentora da RP Travel & Business Education
Rogéria Pinheiro é fundadora e mentora da RP Travel & Business Education
Fundadora e mentora da RP Travel & Business Education, Rogéria Pinheiro, que também é integrante do Comitê de Diversidade da WTM Latin America, reflete sobre a representatividade de profissionais negros no mercado do Turismo. Em um texto que tem como gancho o mês da Consciência Negra e seu dia nacional, celebrado ontem (20), a ponderação convida a pensar sobre o desenho da indústria atualmente e notar que ainda falta equilíbrio nas posições de poder dentro da atividade. Rogéria Pinheiro foi uma das personalidades do Turismo na lista dos 100 + Poderosos do Turismo PANROTAS 2022, que este ano trouxe 50% de mulheres.

Confira o artigo na íntegra a seguir:
"Quantos profissionais negros de sucesso você conhece?
Esse é o tipo de pergunta que gera um certo incômodo e, até por isso, muita gente evita. Mas é preciso falar sobre isso, ainda mais no mês da Consciência Negra.

Hoje, se alguém me fizesse essa mesma pergunta, dentro do mercado de Turismo de luxo eu conseguiria citar três pessoas negras de sucesso: Flávia Máximo, que representa o Patina Maldives e lodges incríveis na África; Christiane Chabes, da CC Hotels; e Wellington Melo, diretor do Hotel Unique.

São profissionais que eu conheço pessoalmente e sei como, mesmo de forma silenciosa, porque hoje não temos espaço para falar sobre os desafios de negros em posições de poder no mercado de Turismo de luxo, estão ali inspirando outras pessoas, incentivando mais e mais gente a se posicionar como um empresário de sucesso, apesar de todos os percalços.

A Flávia e a Chris, em especial, são duas mulheres que me incentivaram muito desde o início dos meus projetos. Em 2016, a Chris contribuiu muito para o meu processo de conscientização ao me convidar para uma palestra sobre racismo com a Alexandra Loras, apresentadora de TV e jornalista francesa. Ela me ajudou a ter uma visão mais politizada sobre a questão racial e, a partir deste encontro que fui a convite da Chris Chabes, eu mudei muito a visão e os planos da minha própria trajetória.

Hoje eu sei que, como empresária, mentora de agências de viagens e influenciadora, consigo inspirar outras mulheres negras e fazer com que elas se sintam representadas, mesmo que de uma forma ainda muito tímida, numa escala grão de areia mesmo. Mas a sementinha está lá. E a cada nova empresária que me procura, que eu consigo ajudar a subir um degrau que seja, é uma vitória.

Eu estou longe de liderar um movimento direto e focado nessa representatividade. Até porque, além das mulheres pretas, estou envolvida (acho que todos estamos, na verdade) em um contexto de mulheres, mães, mães solteiras muitas vezes, que foram por muito tempo escanteadas do mercado de oportunidades e hoje têm uma série de barreiras para se verem e se intitularem como empresárias.

Esse outro movimento acontece paralelamente ao de consciência racial, então a minha história e o meu trabalho é baseado em duas frentes. É devagarzinho, mas com constância, que vejo elas se sentirem mais confiantes, empoderadas e encorajadas para investirem em suas agências de viagens, enfrentando os obstáculos e as circunstâncias muitas vezes desanimadoras de tripla jornada, uma sociedade majoritariamente machista, racista, desigual e ainda muito preconceituosa.

Muito do que faço hoje no meu trabalho como mentora de agências de viagens é apoiar, instruir e não deixar que essas empresárias desistam. Hoje eu preciso manter minha empresa com resultados, valores inegociáveis, integridade e defender com unhas e dentes a minha história, os meus projetos e também minhas mentoradas. E sempre me passa pela cabeça: será que é assim pelo recorte racial? Será que se eu fosse uma mulher branca, nessa mesma posição, seria esse mesmo nível de esforço, entrega e barreiras a vencer? Essa é uma pergunta que eu nunca vou saber responder, porque nunca serei uma mulher branca e minha história foi influenciada diretamente pela questão da cor, obviamente. Da mesma forma o contrário: pessoas brancas não conseguem mensurar o quanto o caminho de um profissional preto para chegar a posições de destaque costuma ser muito mais difícil.

O que eu sei é baseado no retorno que tenho das pessoas que eu convivo e, principalmente, das minhas alunas e mentoradas, cerca de 500 empresárias do turismo que hoje fazem parte da Comunidade Fênix. E elas vem até mim dizer que se conectam com a minha história, que se sentem inspiradas pelo que eu falo e ensino. Mulheres pretas, principalmente, que ainda me procuram de forma tímida, mas crescente, e acabam, de alguma maneira, enxergando que é sim possível alcançar posições de liderança no mercado de turismo. Isso talvez seja o grande valor imensurável do meu trabalho.

Tanto é que, quando eu fui citada como uma das 100 pessoas mais poderosas do turismo pela PANROTAS este ano, o que esse reconhecimento mais significou para mim foi validar uma porta de POSSIBILIDADE. Ao estar neste ranking, eu sei que posso dizer, para cada mulher e cada mulher preta que me procura, que confia na minha trajetória e no que eu falo, que o nosso trabalho pode sim nos trazer sucesso, frutos financeiros, poder. Que podemos estar onde quisermos, tendo acesso ao luxo e ao lugar que desejarmos. Não é o caminho lindamente asfaltado que gostaríamos. Mas é sempre bom lembrar que não é a nossa cor que vai definir isso. É a nossa voz."

Em virtude do mês da Consciência Negra e do dia nacional, celebrado ontem (20), a PANROTAS publicou uma sequência de artigos refletindo sobre o papel dos profissionais negros no contexto atual do setor. Publicaram também artigos a respeito do tema:

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