Da Redação   |   10/09/2025 08:00

Especialista afirma que Brasil encara desafio para expandir produção de SAF; leia o artigo

Em artigo, Dany Oliveira fala sobre a desfossilização do setor aéreo


PANROTAS / Emerson Souza
Dany Oliveira
Dany Oliveira

O Brasil enfrenta o desafio de atender à crescente demanda por Combustível de Aviação Sustentável (SAF), impulsionada pela Lei do Combustível do Futuro e pelo acordo internacional CORSIA a partir de 2027. Apesar da importância do SAF para a descarbonização, a oferta prevista ficará muito abaixo da necessidade e com custo elevado frente ao querosene fóssil.

Ainda assim, Dany Oliveira, engenheiro industrial, especialista em aviação e ex-Country Manager da Iata no Brasil, afirma que o País tem potencial para se tornar líder global no setor, graças à sua experiência em biocombustíveis, base agrícola e capacidade energética. Para isso, precisa atrair investimentos, diversificar matérias-primas e alinhar governos, indústria e pesquisa em uma estratégia conjunta.

Veja o artigo na íntegra:

O Desafio do SAF no Brasil: Entre Mandatos Ambiciosos e uma Oferta (ainda) Insuficiente

"Pressionada por metas de desfossilização e uma crescente consciência ambiental, a indústria da aviação busca no Combustível de Aviação Sustentável (SAF) uma das soluções mais promissoras para reduzir sua pegada de carbono. No Brasil, essa transição ganha contornos de urgência com a promulgação de novas legislações e acordos internacionais. No entanto, o que vemos é um desafio significativo: a oferta projetada de SAF está aquém da demanda imposta por esses mandatos.

De fato, diversas pesquisas apontam que a maioria esmagadora dos líderes da indústria consideram o SAF crucial para os esforços de desfossilização, sendo a melhor opção para atingir a neutralidade. Essa unanimidade, contudo, contrasta com a baixa confiança na adoção generalizada desse combustível até 2030.

Podemos ver neste cenário oportunidades e riscos que exigem uma visão estratégica do ecossistema e gestão de projetos para grandes transformações. A lacuna entre a ambição regulatória e a capacidade produtiva atual não é apenas um problema logístico; é um chamado à inovação, ao investimento e à colaboração.

A Urgência dos Mandatos: Combustível do Futuro e CORSIA

O Brasil, alinhado às tendências globais, tem avançado em sua legislação para impulsionar a desfossilização do setor aéreo. A Lei do Combustível do Futuro é um marco nesse sentido. A partir de 2027, as empresas aéreas nacionais serão obrigadas a desfossilizar suas operações: o percentual de redução de emissões proposto se inicia em 1% em 2027 e chega a 10% em 2037. Este é um passo fundamental para internalizar as metas de sustentabilidade e fomentar o mercado doméstico.

Paralelamente, no cenário internacional, o Carbon Offsetting and Reduction Scheme for International Aviation (CORSIA) entra em sua fase obrigatória também a partir de 2027. Este acordo global visa a neutralidade climática no transporte aéreo, e o SAF desempenha um papel central em seu cumprimento. A combinação desses dois mandatos – nacional e internacional – projeta uma demanda significativa entre 1 bilhão e 3 bilhões de litros de SAF para voos que decolam do Brasil em 2027.

O desafio reside no fato de que a oferta prevista para entrar em operação até lá, mesmo que tudo dê certo, é de apenas 0,66 bilhões de litros. Essa disparidade, conforme apontado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), acende um alerta vermelho para a indústria e os formuladores de políticas públicas.

A EPE tem mapeado os projetos de biorrefino que contribuirão para a oferta de SAF no país. Mesmo somando esses projetos, a projeção indica que a oferta de SAF no Brasil atingirá 1,7 bilhão de litros em 2030 e cerca de 2,8 bilhões em 2035. Embora represente um crescimento significativo, esses volumes ainda serão insuficientes para atender à demanda crescente impulsionada pelos mandatos do Combustível do Futuro e do CORSIA.

Entre 2027 e 2035, os projetos anunciados atendem, em média, cerca de 66% das metas de redução de emissões de gases de efeito estufa.

A Complexidade da Transição e o Papel da Estratégia

A transição para uma economia de baixo carbono, especialmente em setores intensivos como a aviação, não é trivial. Ela exige uma reinvenção ousada de modelos de negócios e uma agilidade na implementação de soluções eficazes. A experiência em gestão de projetos e programas, aliada ao conhecimento em estratégia e inovação, torna-se vital neste contexto.

Uma série de barreiras e fragmentação de responsabilidades impedem a escalabilidade do SAF. A principal é o alto custo do SAF em relação ao querosene de aviação fóssil. Atualmente, o SAF custa entre 2,7 a 11 vezes mais que o combustível convencional e a expectativa é que o SAF fique, em média, 115% mais caro que o combustível convencional em 2030. O Brasil já tem o querosene de aviação mais caro do planeta, quando comparado aos grandes mercados de aviação, imagine o quão custoso será um abastecimento com SAF nessas condições...

Governos e Reguladores são os principais stakeholders para acelerar a adoção do SAF a preços mais competitivos via políticas mais claras, consistentes e robustos incentivos financeiros. Basta lembrar que, de acordo com FMI, anualmente os governos subsidiam combustíveis fósseis em US$7 trilhões.

Oportunidades para o Brasil se tornar a “Arabia Saudita do SAF”

Apesar dos desafios, o cenário atual representa uma oportunidade ímpar para o Brasil se posicionar como verdadeiro líder na produção de biocombustíveis avançados. Nossa trajetória pioneira no bioetanol, aliada a uma base agrícola e industrial estabelecida, oferece um alicerce técnico e logístico inigualável, com regiões promissoras para a produção em terras degradadas. Dessa maneira, são necessários esforços coordenados em diversas frentes:

Atração de Investimentos Massivos: O gap de oferta exige um volume de capital sem precedentes. É crucial criar um ambiente de negócios ainda mais atraente para investidores nacionais e internacionais, com políticas de incentivo claras, segurança jurídica e mecanismos de financiamento inovadores.

Diversificação de Matérias-Primas e Rotas Tecnológicas: O Brasil possui uma vasta biodiversidade e é a grande potencial agrícola do planeta. Além da cana-de-açúcar e do milho, é preciso investir em pesquisa e desenvolvimento para explorar outras fontes, como resíduos agrícolas, óleos vegetais não alimentares e até mesmo resíduos sólidos urbanos, como apontado pela EPE. Some-se a isso, no longo prazo, o eSAF produzido a partir de Hidrogênio Verde (H2V) que possui enorme potencial devido à ampla disponibilidade futura desses recursos renováveis e o Brasil, com sua admirável capacidade em energia renovável, destaca-se como um potencial grande produtor.

Colaboração Intersetorial e Sinergias Industriais: A produção de SAF não é responsabilidade apenas da indústria de energia ou da aviação. Envolve governos, agricultura, logística, pesquisa e desenvolvimento, e o setor financeiro. A união de forças entre esses diferentes atores é essencial para criar uma cadeia de valor robusta e eficiente com agilidade.

Gestão de Projetos de Grande Escala: A construção de novas biorrefinarias e a adaptação das existentes são projetos de engenharia complexos e de alto risco. A aplicação de metodologias avançadas de gestão de projetos disciplinada e adaptativa, com foco em riscos, cronogramas e custos, é determinante para o sucesso e a entrega dentro do prazo.

Inovação em Modelos de Negócios: A IA generativa pode ajudar a otimizar a cadeia de suprimentos, prever demandas, gerenciar riscos e até mesmo identificar novas estruturas de negócios para o mercado para o SAF e seus coprodutos, tornando os projetos mais viáveis e rentáveis.

O Brasil precisa evitar o erro estratégico em ser apenas um exportador de matéria-prima. Para transformar nossos recursos naturais e tecnológicos em valor agregado nacional com uma ampla geração de empregos e renda, precisamos atrair US$600 bilhões em investimentos relacionados à transição energética e indústria verde.

O futuro da aviação sustentável no Brasil e no planeta depende da nossa capacidade de transformar desafios em oportunidades, com ousadia e foco em resultados tangíveis. Desta forma, a real democratização do transporte aéreo chegará a mais pessoas."

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