Chapter 11: por que a Azul pediu recuperação judicial nos EUA, e não no Brasil?
Companhia adota o Chapter 11 para renegociar dívidas com credores internacionais e garantir operações

A Azul Linhas Aéreas ingressou hoje com um pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos, com base no Chapter 11 do U.S. Bankruptcy Code. A medida tem como objetivo promover uma ampla reestruturação de seu passivo financeiro perante credores internacionais, assegurando a continuidade das operações e a preservação de seus ativos, sem interrupções no Brasil.
Segundo a empresa, o pedido de proteção judicial foi motivado por um conjunto de fatores que impactaram fortemente sua estrutura financeira nos últimos anos. Apesar da crise, a Azul garantiu que seguirá operando normalmente.
Como parte da reestruturação, a companhia contará com o apoio do DIP Financing (Debtor-in-Possession Financing), instrumento previsto no sistema norte-americano de falências. É um financiamento prioritário, autorizado judicialmente, que permite à empresa devedora obter liquidez durante o processo de recuperação.
Para o sócio do Lara Martins Advogado e especialista em insolvência empresarial, Filipe Denki, a decisão da Azul de recorrer ao Chapter 11 nos Estados Unidos, e não à recuperação judicial brasileira, está diretamente relacionada à estrutura internacional de seu endividamento e às limitações impostas pela Lei nº 11.101/2005.
“A legislação brasileira de recuperação judicial ainda exclui da sujeição ao processo diversos créditos estratégicos, como os decorrentes de arrendamento mercantil (leasing), amplamente utilizados por companhias aéreas para a obtenção de aeronaves. Isso impede que contratos essenciais entrem na mesa de negociação, tornando a equalização do passivo extremamente difícil”
Filipe Denki, sócio do Lara Martins Advogado
Além disso, segundo ele, o sistema norte-americano oferece mecanismos mais previsíveis e eficientes de proteção patrimonial, centralização de discussões com credores globais e acesso ao DIP Financing, um financiamento prioritário que seria muito mais complexo de implementar no Brasil. Além disso, o contexto atual reforça uma tendência já observada em outras empresas brasileiras.
“Quando há forte exposição a credores internacionais e contratos em moeda estrangeira, o ambiente jurídico norte-americano é percebido como mais estável, célere e eficaz para reorganizações complexas. O Chapter 11 permite suspender ações e execuções globalmente, proteger ativos e negociar coletivamente com credores num só foro judicial”, explica Denki.
Corro risco de ficar sem voo?
O especialista em Direito Empresarial e sócio do Godke Advogados, Fernando Canutto, endossa que se o consumidor já tiver passagens compradas com a Azul, o risco de ficar sem voo é baixo. “Quanto a um cancelamento de voo, não posso dizer que é impossível, mas é altamente improvável que haja impacto imediato. A maioria das companhias aéreas continua a honrar as reservas durante o processo de reestruturação”, destacou o advogado, ressaltando ser mais provável que haja alterações em horários ou rotas do que cancelamentos totais de voos.
Canutto deixa claro que recuperação judicial não se equivale à falência. “Ao contrário da falência, que geralmente implica na liquidação da empresa, o Chapter 11 permite que a empresa continue operando enquanto reestrutura suas dívidas. É uma tentativa de salvar a empresa e evitar a falência”, conclui o advogado.