Leonardo Ramos   |   12/11/2018 12:00

Fraudes no Turismo: parte 1 - nosso mercado é um alvo fácil?

Entenda como o crescimento da informalidade nos negócios de Turismo tem tornado nosso segmento um alvo fácil para os golpes

Entre hoje e quarta-feira (14), o Portal PANROTAS trará uma série de três reportagens sobre um tema antigo, mas que segue como uma das maiores preocupações do mercado de Turismo: as fraudes.

Trataremos do por que o Turismo tem sido um alvo fácil para os golpistas; levantaremos os meios mais utilizados para enganar agências, operadoras, consolidadoras e até aéreas; debateremos os métodos de combate à fraude mais utilizados atualmente e dicas para as agências se prevenirem dos golpes e, enfim, o papel das grandes associações diante disso, especialmente da aviação - Air TKT, Iata, Abear...

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ORIGENS

O assunto é antigo. Histórico, para ser mais exato. Falar sobre fraudes é pensar em algo que se originou milênios atrás. Escrito nos primórdios da economia, o Código de Hamurabi, datado do século 17 a.C., já definia casos de fraudes e suas respectivas punições. Alguns milhares de anos depois, os golpes continuam. E se depender da inventividade dos praticantes dos mais diversos tipos de fraude, isso não deve acabar tão cedo.

O Turismo entra neste cenário. Não apenas como coadjuvante, mas como protagonista: a aviação é alvo líder quando se fala em fraude, representando 46% de todos os golpes que acontecem no globo. E o Brasil não apenas não escapa, como é um dos piores do mundo nesse assunto: é o quarto país que mais sofre fraudes de tipo phishing.

"É quando alguém envia um e-mail ou até site falso para o alvo dizendo ser uma empresa que não é e solicitando dados e informações pessoais, como senhas e documentos de identidade... É um modo de literalmente 'pescar' a vítima", destacou o gerente de Economia da Associação Latino-Americana de Transporte Aéreo (Alta), Juan Sarmiento, fonte das demais informações acima. Phishing é também o meio mais utilizado de fraude no planeta: corresponde a 48% delas, bem à frente do velho conhecido vírus cavalo de troia, responsável por 25%.

Leonardo Ramos
Juan Sarmiento, da Alta, com Jefferson Simões, da Iata
Juan Sarmiento, da Alta, com Jefferson Simões, da Iata

Mas se você questionar o trade nacional, não importa o meio que você chegue na empresa (phishing, cavalo de troia, roubo de dados…), o que mais se ouve mesmo é que a compra fraudada acontece por um cartão de crédito clonado.

“E o principal alvo disso, e onde acontece a gigantesca maioria dos casos, são as agências de viagens, primeiro passo da compra do viajante”, declara o sócio e vice-presidente da BRT Consolidadora e Operadora, Marco Di Ruzze.

“Elas [agências], muitas vezes, só pegam o número do cartão, a data de validade e senha de segurança e mandam para o banco. Se eles falarem que o crédito é suficiente para a compra, pronto, vende! Sem pedir mais dados que comprovem a autenticidade do viajante. Para ter uma ideia do nível disso, 75% dos calotes que levamos são fraudes, pagamentos com cartões clonados que as agências aceitaram sem conferir. O dinheiro nunca chega”, conclui Di Ruzze.

Jhonatan Soares
Marco Aurelio Di Ruzze, do Grupo BRT
Marco Aurelio Di Ruzze, do Grupo BRT

POR QUE O TURISMO É UM ALVO FÁCIL?

Uma série de fatores fazem do Turismo um terreno fértil para golpistas. Dois deles, porém, são cruciais pelo interesse no segmento. Um deles a quantidade de transações diárias de dados que acontecem no dia a dia da escada cliente-agência-operador-consolidadora. O segundo é o principal deles: a informalidade de tal troca de informações.

“O que você acha que o cracker [nome técnico de quem rouba dados] prefere: pulverizar a busca de cartões de crédito para clonar entre milhões de pessoas, ou focar nas agências e até operadoras, que concentram milhares de compras no dia a dia?”, questiona Di Ruzze.

E é nesse ponto que a informalidade que ronda o mercado, por mais que seja um modo de agilizar as vendas e aumentar a comodidade do consumidor, torna-se uma bomba nas mãos da indústria de Turismo. O uso constante do Whatsapp, e até mesmo de e-mails, para enviar os dados de cartões de crédito do cliente para a agência, ou da agência para a operadora, faz das empresas de Turismo um prato cheio para o cracker que busca roubar dados de cartões para clonar e, enfim, realizar a compra.

COMO ACONTECE A COMPRA FRAUDADA?

Após o “roubo” dos dados, chega a hora do cracker realizar a compra da passagem com o cartão clonado. E, novamente, a usual informalidade do nosso mercado acaba sendo um facilitador para o golpista na hora de enganar a agência.

São diversas as maneiras utilizadas pelo “falso cliente” para chegar na agência e efetuar tal compra, mas o mais comum é que o fraudador mande os dados ou foto do cartão pelo Whatsapp ou e-mail pedindo para emitir o bilhete, colocando apenas o nome do passageiro como informação pessoal. A agência muitas vezes aceita a compra, mesmo sem conhecer o cliente - afinal, vender é vender.

O golpista leva a vantagem, principalmente com o crescimento dos negócios pelas redes sociais, de não precisar estar cara a cara com o agente para realizar a compra.

“Ele faz o pedido pela rede e infelizmente a agência muitas vezes dá sequência à compra. Quando descobrir que o cartão era clonado e o pagamento não chegar será tarde demais, o voo já terá acontecido e a dívida sobra para a agência”, descreve o diretor comercial da Skyteam Consolidadora, Márvio Mansur.

Emerson Souza
Márvio Mansur, da Skyteam
Márvio Mansur, da Skyteam

O executivo exemplifica: “existem meios tão grosseiros que eles usam para ganhar a confiança do agente… Já vi casos deles tirarem uma foto do cartão de crédito Black ao lado do volante de um Audi, e enviarem para o agente pedindo uma viagem para o dia seguinte. O profissional vê o carro, acha que é só um ricão que quer viajar, e pronto, aceita a compra”, encerra, arriscando que o prejuízo mensal com fraudes gira “em torno de R$ 100 mil por mês” na Skyteam.

INFILTRADOS DO MERCADO?

Algo que foi repetido pelas consolidadoras questionadas é o fato de os fraudadores, geralmente, terem um conhecimento profundo das engrenagens do mercado de Turismo. Ex-funcionários de agências, operadoras, consolidadoras, ou até mesmo golpistas com contatos internos das empresas foram citados como possíveis origens de tal conhecimento - determinar a fonte, porém, é tão complicado quanto prender um fraudador.

“As artimanhas geralmente são realizadas por pessoas que conhecem o comportamento das consolidadoras, das companhias aéreas e até mesmo a rotina de uma agência, o que passa maior credibilidade em suas ações”, detalhou o supervisor de TI da Sakuratur, Tiago Souza.

A gerente de Marketing e Relações com Fornecedores da Esferatur, Juliana Abrantes, corrobora. Ela relata que os golpistas que buscam atingir a consolidadora, recentemente adquirida pela CVC Corp, geralmente utilizam documentação e dados furtados ou clonados. “Eles buscam obter o máximo de informações sobre a agência, seus proprietários, funcionários e até clientes para elaborar uma história convincente e, assim, aplicar os golpes em agências se passando por passageiros ou empresas. Este tipo de prática é conhecida como engenharia social”, conclui Juliana.

Emerson Souza
Juliana Abrantes, da Esferatur
Juliana Abrantes, da Esferatur


COMO COMBATER A FRAUDE?

Conhecer o mercado torna mais fácil enganá-lo. Saber como funciona a reserva, como os dados são transferidos, como o pagamento é realizado… São todas informações que, nas mãos de alguém mal intencionado e com a capacidade de hackear um computador ou clonar um cartão - o que hoje existe aos montes -, tornam o mercado do Turismo um alvo fácil para fraudes. E sua informalidade, especialmente no uso das redes sociais para agilizar vendas, acaba sendo sua maior vulnerabilidade.

Na segunda parte deste especial, que sai nesta terça-feira (13), o Portal PANROTAS apresentará os perfis mais repetidos de golpes. Conhecê-los à fundo pode fazer com que agências deixem de estar vulneráveis aos ataques, e fiquem sempre um passo à frente deles.

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